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Estão guardadas na Quasi


terça-feira, 16 de outubro de 2007

Há quanto tempo ando eu à espera dum POEMA?

"A Poesia merece-me um profundo respeito e o acto da escrita, que a ela diz respeito, entendo-o como um labor de aplicada e fina emoção, que sublima e enreda pelo toque da criação, pelo simbolismo das palavras, pelo seu uso melódico, harmónico e rítmico, pelo desvio a todas as normas codificadas, pela criação de uma nova realidade onde aposta a imaginação encarnada em imagens e símbolos. (...). Não há palavras poéticas, há sim palavras exacta que conseguem sugerir a emoção. É isto, sim, a emoção. (...) A emoção que nos faz agarrar num poema e fazer dele um ponto de partida e de chegada, que faz transbordar um mundo inimaginável dentro de nós, que se torna uma jóia cada vez que relido, relevando um brilho diferente. Um poema é um mundo inesgotável pleno de cintilações. Chamemos, pois, ao discurso poético, a ressureição da linguagem emotiva. Ser poeta é um estado de graça. E á interrogação se o poeta nasce ou se faz eu responderia que as duas coisas. Quero com isto dizer que a sensibilidade não é distribuída a todos por igual. E que esta é fundamental para a adesão à poesia. E que nem todos têm o dom da emoção ou das emoções. Mas parafraseando Ruy Belo «a poesia é uma coisa que também se aprende«. Isto é: o exercício da leitura, o despertar do amor pelas palavras, o caldeamento do seu peso, a vulnerabilidade da sua textura, é uma aprendizagem para quem tem o dom que, por si só, não constrói o verdadeiro poeta. Com isto pretende dizer-se que nem todos os que versejam atingem a estatura «divina». Mas o versejador não tem o seu lugar? Estaremos aqui a depreciar aqueles que se dão ao prazer dos versos porque necessariamente gostam das palavras e de dizer-se? Naturalmente que não. Quem verseja tem o seu lugar e tem todo o direito de se dar a ler. E quem sou eu, afinal, para achar que não haverá destinatários para os seus escritos? (..) Das pessoas que escrevem versos nem todas chegarão a ser poetas. Por dentro das palavras há que descobrir, por vezes debaixo da cinza, uma chama, uma cintilação, um brilho. E por mais que nos esforcemos muitas há em que, ao correr de todos os versos, nada transborda E por mais que publiquem ficarão sempre versejadores. (...) Outros há que dominam a técnica. Os acentos estão no sítio, a métrica perfeita, a rima soante ou consoante surge no local próprio. Mas só isso. Que é pouco. Que é nada. Por tudo isto há que chamar as coisas pelo que elas são. O seu a seu dono. Sem medo de exclusões, sem atitudes classistas, sem arvorar em mentor. Apenas pelo respeito aos Poetas. Pelo Amor à Poesia. Pela defesa da qualidade, pela dignificação das palavras. E os versos continuarão a ter o seu lugar. Os versejadores também. Há quanto tempo ando eu à espera dum POEMA?

MARIA AURORA HOMEM


Há quanto tempo eu ando `a espera da Aurora Boreal?

1 comentário:

Anónimo disse...

eu axei muito legal esse texto

Emparedada/Uit de Muur

Emparedada/Uit de Muur
Um ciclo de poemas portugueses e neerlandeses

Klompen / Socos


Klompen/ Socos

Klompen/ Socos: tamancos, chinelas de pau, tb. acto de toque fisico, agressivo, da /tua, minha/ mao na / minha, tua/ face

Klompen


Gostava de te dizer como são os meus passos que me afastam de ti.
Como não vivo para ti, nem escrevo para ti.

Como não penso no meu amor, nem te amo em pensamento.

Como não te vejo nos lugares onde nunca estivemos juntos.

Como tu não me pisas quando me obrigas a seguir os teus passos,
ou como não me calcas quando descalças os pés às leonores
que bebem da tua fonte.

Como caminho firme e confiante pelos prados holandeses, entre as vacas e a lama,
e me afasto cada vez mais de ti.

Como os meus passos se afastam dos teus passos, correndo para longe, longe,
esperando que o mundo seja realmente redondo, e não plano,
e possa, um dia, chegar às tuas costas, tapar os teus olhos e dizer-te
mijn thuisland is niet meer mijn taal.


Socos


Ik wilde je zeggen hoe mijn stappen zijn die mij van je verwijderen.

Hoe ik niet leef voor jou, niet eens schrijf voor jou.

Hoe ik niet denk aan mijn liefde en je evenmin bemin in gedachten.

Hoe ik je niet zie op de plaatsen waar we nooit samen waren.

Hoe je me niet vertrapt wanneer je me dwingt je stappen te volgen,
of hoe je me niet plet wanneer je de schoenen uittrekt
van de leonoors die drinken uit jouw bron.

Hoe ik ferm en vol vertrouwen door de Nederlandse weiden loop,
tussen koeien en modder, en me steeds verder van je verwijder.

Hoe mijn stappen zich verwijderen van jouw stappen, rennend naar de verre verten,in de hoop dat de wereld werkelijk rond is, en niet plat,
en dat ik op een dag achter je sta, mijn handen op je ogen leg en zeg
a minha pátria já não é a minha língua.


Joana Serrado, Emparedada/ Uit de Muur, Uitgeverij de Passage, 2009, p. 32, 33

A minha pátria não é a minha língua